MARIO DE ANDRADE EM VIAGEM
No espelho, estou sorrindo.
Dentro de mim ferve uma melancolia assobradada,
morena, ancestral, cor de incesto.
Faz uns seis dias que vivo dividido,
território feito campo-de-batalha
por personalidades em conflito.
Junto da crescente embriaguez espontânea,
concluo ser preciso perder o caráter de uma vez,
e com o auxílio eficaz do álcool e do sedol,
vou diluindo as partes de mim.
O som de chuva que cai nas ondas já se ouve melhor.
Passam as cores na rapidez vertiginosa do crepúsculo,
e o mundo repousa calmamente de cabeça-para-baixo
Vou, passos de pluma, para o cassino do navio.
Provo as delícias refinadas da tonteira,
do balanço do mar e ácidos digestivos.
E satisfeito,
aposto todo meu dinheiro no ás de paus.